Em tempos de algoritmos, saiba mais sobre como a LGPD e a Lei de Cadastro Positivo lidam com dados pessoais dos cidadãos
Em uma das canções de seu álbum mais recente, lançado em 2022, o uruguaio Jorge Drexler dispara os seguintes versos: “Dime qué debo cantar / Oh, algoritmo / Sé que lo sabes mejor / Incluso que yo mismo”. Assim, o cantor e compositor aborda uma temática que tem tudo a ver com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). Mesmo sem mencionar a expressão diretamente, a letra aborda a questão do uso de dados pessoais por empresas. Sobretudo por aquelas que são mediadas por plataformas virtuais.
Se você utiliza aplicativos de distribuição de músicas e podcasts, certamente vai reconhecer a situação em que o algoritmo faz sugestões e te leva para a próxima canção mesmo sem você apertar nada, com base em suas escolhas prévias e estilos mais consumidos. Por outro lado, os artistas também lidam com a pressão de agradar e produzir conteúdos capazes de atingir bons números de audiência.
Há uma outra situação que é bem provável que você já tenha vivenciado, ao zapear a rede social: se deparar com alguns (ou vários) anúncios relacionados justamente a uma busca que fez anteriormente pela internet. Quantas vendas devem ser convertidas dessa maneira?
O foco desse texto não é atribuir julgamento ao definir essas práticas como certas ou erradas. Se elas deveriam ou não existir. Mas, sim, chamar a atenção para o interesse econômico que atualmente envolve os dados pessoais. E, por consequência, para a importância de existir uma legislação para estabelecer diretrizes e limites para a coleta e o uso dessas informações.
Informação e poder
Quem nunca ouviu a máxima “informação é poder”? Principalmente em tempos que tanto se fala desses algoritmos. Ou seja, numa época em que prospera um modus operandi no qual usuários fornecem dados e empresas os coletam e transformam em conhecimento.
Dessa forma, empresas com essa habilidade transformam dados brutos em ativos. Isto é, em informações valiosas que podem servir a interesses econômicos. Sejam diretamente comerciais, sejam de fortalecimento de influência de pessoas e marcas.
Sem dúvida, o ramo da publicidade é um dos que mais se aproveita desse cenário. Afinal, ao deter o conhecimento sobre as preferências dos usuários, é possível otimizar o alvo dos anúncios e minimizar o desperdício de recurso ao tentar ser visto por quem não é cliente potencial.
Na mesma música citada no início desse texto, Jorge Drexler deixa o questionamento: “¿Quién quiere que yo quiera lo que creo que quiero?”. Uma versão cantada de uma reflexão mais que pertinente para a atualidade, não é?
Dados pessoais e o viés financeiro
Até aqui, os exemplos estiveram concentrados no favorecimento de relações comerciais, nos quais empresas aproveitam a chance de potencializar a exposição de seus produtos, serviços e marcas diante dos consumidores que querem atingir.
No entanto, também é preciso levar em consideração os casos em que os dados servem para vetar o acesso de pessoas a determinados serviços ou bens de consumo. O que acontece a partir da visualização e da análise de dados financeiros pessoais.
É sobre isso que Cinthia Obladen de Almendra Freitas – Doutora em Informática e professora Permanente do Programa de Pós-Graduação em Direito (PPGD) da PUCPR – e Maylin Maffini – advogada, mestre em Direito Socioeconômico e membro da Comissão de Direito Bancário da OAB/PR – falam no artigo “A proteção dos dados pessoais no Crédito Bancário e a Lei Geral de Proteção de dados frente ao Cadastro Positivo”.
“A tutela dos dados pessoais é objeto cada vez mais importante frente aos algoritmos que podem ‘rotular’ pessoas e seu crédito, sendo assim fonte de discriminação”, alertam as autoras.
A saber, a concessão de um empréstimo ou financiamento – transações financeiras altamente presentes na cultura brasileira – depende do chamado credit score. Isto é, da soma de uma série de informações que calculam o potencial de risco que um cliente apresenta. Em outras palavras, quais as chances de ele ser um bom pagador.
Lei do Crédito Positivo e LGPD
Ao longo do artigo, Cinthia Freitas e Maylin Maffini demonstram que discutir privacidade e os mecanismos utilizados pelas empresas em relação a decisões financeiras não é uma tarefa fácil. Sobretudo diante de alguns pontos que entram em conflito ao considerar a LGPD e o disposto na Lei do Cadastro Positivo – Lei 12.414/11, alterada pela Lei Complementar nº 166 (de 8 de abril de 2019).
“Por um lado, pretende-se assegurar a privacidade e garantir o controle dos dados pessoais na LGPD, mas por outro, é autorizado o tratamento de dados pessoais de forma automática, sem o consentimento e amplo controle dos indivíduos frente a Lei do Cadastro Positivo”, observam.
Embora ainda haja um longo caminho a percorrer, as pesquisadoras acreditam que a LGPD traz um avanço nesse sentido. “Portanto, a partir da vigência da LGPD, ter-se-á a oportunidade de acompanhar o amadurecimento da legislação, a movimentação dos titulares de dados em busca de seus direitos e, principalmente, corroborar com a mudança da cultura de dados no Brasil”, escrevem.
Além disso, as pesquisadoras defendem que, em paralelo com a legislação, é importante refletir sobre a necessidade de educação financeira para a população. Tanto para reduzir os índices de endividamento e nomes negativados, quanto para incentivar a geração de empregos e a injeção consciente de valores na economia.
Curso de curta duração sobre LGPD
Ficou com vontade de entender melhor os princípios da LGPD e como ela é aplicada no Brasil e em outros países, não só no quesito financeiro? Então aproveite que a PUCPR está com inscrições abertas para uma atividade de curta duração sobre isso.
Trata-se do curso “LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados) e GDPR (General Data Protection Regulation): Principais aspectos sobre as legislações de Proteção e Privacidade de Dados em vigor no Brasil e na União Europeia”.
A saber, são 6h de carga horária, dispostas em três noites, de 14 a 16 de março de 2023. A modalidade é de aulas virtuais, ao vivo. Ou seja, o aluno pode participar de onde estiver.
A formação faz parte do rol de cursos da terceira edição da Escola de Verão de Direito da PUCPR. Assim, tem o intuito de atender advogados, estudantes de Direito (de todas as instituições) e profissionais que querem começar o ano se aprofundando no tema.
Clique aqui para ver mais detalhes e fazer sua inscrição.